quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Quanta grosseria

A estatística é do Instituto Brasileiro do Vinho - Ibravin: de cada três garrafas de vinhos consumidas no país, duas saem das prateleiras dos supermercados. E mais: 70% dos consumidores se decidem pela compra de forma impulsiva, portanto, sem planejar a aquisição. E vinhos de supermercado, com raras exceções, são tratados com descaso - do armazenamento à venda. Até mesmo um rótulo digno pode perder suas virtudes na posição ereta em que são mantidos, em condições de grande luminosidade e manuseio no estilo 'deixa que eu chuto'. Não tem vinho que suporte tanta descortesia. Não por acaso quem se inicia na bebida a partir de um rótulo tratado com essa grosseria se decepciona ao perceber que o aparente 'vinho bom', deixa um gosto ruim na boca, aquela sensação de que se está a tomar algo avinagrado.

Mardita da boa


Nem só de vinho vive o homem. Aliás, num país em que se consome menos de dois litros de vinho per capita ano (os argentinos entornam 45 litros/ano), nada mais natural que outra bebida tenha presença mais frequente no copo dos nativos. Trata-se da cachaça – pinga para os iniciados. Ainda vamos aqui ser menos econômico com essa autêntica representante do etilismo nacional, mas agora basta saber que essa dona ao, a Piragibana, está naquele patamar da ‘melhor do Brasil’. Não sei. Como já disse, sou avesso a esse conceito de ‘melhor’. Melhor segundo quem? Se consola saber, essa mardita tem no DNA algum cromossomo da mítica Havana – e isso até no preço: a garrafa de 600 ml custa R$ 250.

Bom para tempero, sagu...

João Carlos é um iniciante na ‘arte de baco’ e enviou-me e-mail solicitando minhas impressões sobre um rótulo argentino, o Latitud 33°. Antes que destile minhas imprecações e alguém se apresse a lembrar-me da frase lapidar que orienta esse espaço, segundo a qual o bom vinho é aquele que se toma e gosta – e pronto! - , sublinho que foi Carlinhos quem me pediu opinião. Então lá vai: vinhos vêm ao mundo para cumprir duas funções – uma para se bebido, outra para servir de ingrediente culinário ou outra vocação qualquer na cozinha. Alguns são cultuados em rituais enochatérrimos e se tornam disputados, venerados – e caros. Outros não chegam a tanto e cumprem destino modesto, mas com alguma nobreza: são degustados com alguma reverência e se tornam vinhos ‘honestos’. O Latitud se presta a um outro tipo de missão: servir de base para tempero de cebola, para batidas e é imbatível no sagu. Na taça, é sem graça, que de vinho só tem a cor.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Wine MBA por R$ 65 mil


Os negócios que envolvem a produção e comercialização de vinho apontam para prosperidade incomum, da mesma forma que se notabiliza pela complexidade de sua gestão num mundo globalizado, onde rótulos transnacionais trafegam indiferente às fronteiras. Para dar conta das demandas da atividade, os franceses criaram o Wine MBA na Bordeaux Management School. É o único curso do gênero no mundo e a sala de aula é itinerante, com lições em Paris, Londres, Adelaide e Estados Unidos. O curso, de 22 meses, custa R$ 65 mil. Mas não é qualquer um que pode se candidatar ao MBA: para ser admitido na escola é preciso comprovar ao menos cinco anos de experiência na atividade vinícola, em qualquuer área das muitas que permeiam o negócio.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

O melhor do mundo


Sou avesso a qualquer lista que aponte ‘os melhores do mundo’. Seja qual for o objeto da análise – música, filmes, livros... -, cada um tem sua própria relação. Mas no início de 2008 ocorreu um fato curioso num respeito evento realizado em Paris. No Vinailes Internacionales um insuspeito rótulo português da Casa Ermelinda Freitas botou banca sobre três mil outros concorrentes oriundos de quatro dezenas de países e se arvorou o melhor tinto da Terra. O Sirah, 2005, custava, à época do concurso, modestos US$ 25 dólares. Hoje, não se encontra uma garrafa por dez vezes esse valor. Além de premiado, o vinho é raro: foram feitas apenas cinco mil garrafas colocadas à venda apenas no mercado português.

Embaixo, no meio, em cima



Antes que interpretem de forma equivocada o post sobre o vinho Frontera, associando-o a uma vinícola qualquer – os não iniciados podem fazer essa confusão -, é oportuno que se diga que a Concha y Toro é uma das mais reputadas empresas do mundo e construiu sucesso internacional ao longo de 127 anos de história. O mix de produtos da empresa é extenso como suas área de produção. A vinícola é ambiciosa e de suas adegas saem rótulos para todos os gostos e bolsos. Além de uma infinidade de rótulos mais ‘populares’, entre eles o afamado Casillero del Diablo, a Concha y Toro elabora os mais destacados vinhos do mundo, como o Don Melchor, referência ao fundador da vinícola e o Carmin de Peumo


Dados corporativos
● Origem: Chile
● Fundação: 1883
● Fundador: Don Melchor De Concha y Toro
● Sede mundial: Santiago, Chile
● Proprietário da marca: Vina Concha y Toro S.A.
● Capital aberto: Sim (1933)
● Chairman: Alfonso Larraín Santa Maria
● CEO: Eduardo Guilisasti Gana
● Enólogo: Max Weinlaub
● Faturamento: US$ 579.9 milhões (2008)
● Lucro: US$ 63.3 milhões (2008)
● Valor de mercado: US$ 1.3 bilhões (maio/2009)
● Vinícolas: 48
● Produção: 100 milhões de litros de vinho
● Presença global: 125 países
● Presença no Brasil: Sim
● Funcionários: 1.000
● Segmento: Bebidas Alcoólicas
● Principais produtos: Vinhos
● Ícones: O vinho Casillero del Diablo
● Website: www.conchaytoro.com

Bom na boca e no bolso


O consumidor tradicional de vinho é infiel - não se deixa embriagar pelo menos rótulo sempre. Assim também pensa Acyr Valença, ex-Casa Valença, cuja competência profissional de profundo conhecedor da bebida está a serviço da Adega Brasil. Na prática isso significa que devemos enterrar nossos narizes em taças inéditas para apresentar ao nosso olfato – e paladar – novos aromas e sabores. Fui o que fiz dia desses por sugestão de um amigo, recém-convertido ao mundo do vinho. Arrisquei-me numa garrafa de carménère da linha Frontera, da onipresente Concha y Toro, a toda poderosa vinícola chilena. Trata-se de um produto ‘industrial’, alguns bagos acima do Reservado, outra referência popular da Casa. O vinho é simples, mas talvez sua principal virtude resida exatamente aí: despretensioso, não almeja nada além da simplicidade. Depois de gestar por nove meses em inox (nada de madeira nesse processo), o evolui para 13,5 graus de teor alcoólico e cumpre plenamente a função de agradar na boca - e no bolso: custa em média R$ 30.

Então, que assim seja!

Antes de mais nada, registre-se: o bom vinho é aquele que você bebe e ponto. Não se fala mais nisso! Bom que se diga também que sou adepto da simplicidade no consumo de vinho. Nada daqueles rituais que mais enganam que seduzem. Aliás, concordo com o documentarista Jonathan Nossiter, que entre outras obras assina Mondovino, para quem a glamourização do consumo do vinho conspira contra a modesta origem da bebida, cujo passado é da mais pura simplicidade. Mas sem entrar nessa discussão que me parece a mais absoluto perda de tempo, considerandoq ue na primeira frase desse texto já sintetizei minha percepção do assunto, vamos ao que interessa. Esse modesto blog não tem pretensão alguma, a não ser falar fácil e rápido sobre vinhos e outras bebidas. Então, que assim seja!

Carménére: debutante chilena

Há 15 anos, o enólogo Jean Michel Bousiquot desembarcou no Chile como uma inusitada missão: descobrir o que teria ocorrido com um parreiral de Merlot, que aparentava ser sofrido algum tipo de mutação e se diferenciava da cepa original em vários aspectos. Jean Michel logo se deu conta que estava diante de uma nova variedade há muito extinta, a Carménère. A uva tinta desapareceu dos campos europeus no início do século 20, devastada pela filoxera, flagelo que impôs um divisor de águas na história da vitivinicultura mundial. Desde que o enólogo fez a descoberta, o Chile avançou – e muito – na vinificação da variedade, a ponto da uva ser considerada emblemática do país. Vinificada como varietal ou em cortes, a Carménère se notabiliza pela singularidade de seus aromas, razão pela qual é uma cepa diferenciada que permite a elaboração de tintos sofisticados, com taninos amigáveis e, portanto, mais adequados a paladares menos treinados. Varietais da Carménère apontam para vinhos que devem ser consumidos jovens, quando se notabilizam suas qualidades mais destacadas.